CORPO – LINGUAGEM INFINITA


O ponto de partida do trabalho da Obragem é o corpo: movimento, voz, consciência, presença; o corpo relacional das pessoas deste tempo, retalhado, erótico. Ao investirmos na expansão e expressão do corpo, estamos pensando o comportamento atual, em que todas as circunstâncias são decisivas e que nos desdobramos para manter o equilíbrio, mesmo que precário, transgressor, limítrofe. Em nossos trabalhos, temas conflitantes como a perda, a violência - cada vez mais refinada, a compaixão, a dor, a inocência e o amor são combinados de diferentes formas. São temas inerentes à nossa condição, estão nas nossas vidas, na vida de todas as pessoas, todos os dias. Acreditamos que o teatro é um meio eficaz de nos aproximar desse lugar de confronto. Segundo Artaud, que inspira nosso trabalho, “ ... o teatro é portanto uma formidável convocação de forças que reconduzem o espírito, pelo exemplo, à origem de seus conflitos”. (1)

A experiência com a realidade nos mostra a imperfeição e também a beleza humana. No corpo, na carne, pesada, quente, viva, temos o mesmo furor da sociedade; nele, adivinhamos nossas ternuras da mesma forma implacável que adivinhamos nosso vazio; à partir dele, o corpo, pensamos a cultura e a linguagem. No corpo, com sua linguagem infinita, não há uma coisa antes ou depois da outra, mas condições para que nossa qualidade de devoradores possa se expressar num campo de relações. Queremos entender a natureza humana, seu espírito, por meio das suas relações, dos espaços entre ela e todas as outras coisas. Nos interessam as equivalências, as metáforas. A imitação pura da realidade é redutora.

Na pesquisa sobre a matéria, corpo e voz, encontramos mais perguntas e mais espaços de inquietação. Temos a possibilidade de trazer à tona o invisível. Peter Brook, em seu livro A porta aberta, diz que “a vida de um ser humano é o visível através do qual o invisível pode aparecer”.(2) A Obragem está aterrada nessa investigação sobre a matéria; matéria que é carne, osso, órgãos, consciência, presença, memória, voz, informação, enfim. Entendemos corpo como energia que expande fronteiras, vida que alarga os limites que a revestem. Na biologia, um corpo se define por sua fronteira entre o dentro e o fora; no trabalho que desenvolvemos é difícil definir essa separação, o indivíduo está vivo, também, em seus prolongamentos. Percebemos isso na emoção, por exemplo, pois ela mistura-se com o nosso conhecimento e com a percepção que temos de nós próprios. António Damásio fala sobre isso em seu livro O mistério da consciência.. (2) A Obragem trabalha com o intuito de tornar mais viva a expressão e de se aproximar do sentir. Nosso desafio está em fazer essa expressão ocupar o espaço da representação, com o trabalho corporal e vocal amplificado às proporções da linguagem sem, no entanto, distorcer a relação de comunicação que buscamos estabelecer com a platéia.

A busca de contato com a totalidade do corpo permeia os anseios da Obragem, está no espaço e no instante, é a forma que encontramos de reverenciar a vida.


Olga Nenevê e Eduardo Giacomini
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